O Brasil é uma potência agrícola, responsável por alimentar mais de 1 bilhão de pessoas no planeta!
O agronegócio brasileiro garante tanto ao mercado consumidor interno quanto ao internacional o abastecimento regular de alimentos. Mas, paradoxalmente, a engrenagem que sustenta esse sistema — o crédito rural — ainda se torna refém, ano após ano, de uma definição política precária, negociada a portas fechadas, cujo desfecho – não raro! – só chega no apagar das luzes do semestre fiscal: o Plano Safra.
A cada novo ciclo, produtores rurais esperam com ansiedade (e muitas vezes com angústia) a divulgação do volume de recursos e das condições de financiamento que garantirão o custeio da próxima safra. Em 2025, mais uma vez, pairam incertezas quanto ao valor que será anunciado — e essa instabilidade não é técnica nem conjuntural: ela é estrutural e a raiz do problema está no próprio desenho orçamentário do plano safra.
Diferentemente da saúde e da educação, que possuem percentuais mínimos vinculados ao orçamento público, o crédito rural não é tratado como despesa obrigatória, tampouco como vinculação constitucional. Trata-se de uma decisão discricionária do Poder Executivo, sujeita às circunstâncias fiscais e, sobretudo, às diretrizes ideológicas do governo de ocasião.
Entrementes, não deveria ser assim!
Não quando se trata de segurança alimentar, reconhecida como direito social fundamental no art. 6º da Constituição Federal, incluída pela Emenda Constitucional 64/2010. Não quando a soberania nacional depende diretamente da nossa capacidade de produzir e distribuir alimentos em escala suficiente para atender à demanda nacional.
Segurança alimentar é segurança nacional — e exige tratamento orçamentário à altura desta envergadura constitucional.
A Constituição já assegura à saúde (art. 198, § 2º) e à educação (art. 212) percentuais mínimos da receita da União e dos entes federados. Esses percentuais não apenas garantem previsibilidade de recursos, como também funcionam como blindagem contra governos que eventualmente relativizem a importância dessas áreas.
Nada justifica que a produção de alimentos, em um país cujo protagonismo internacional depende da agropecuária, continue sendo tratada como item acessório. A segurança alimentar está para o campo como a dignidade da pessoa está para a saúde e a educação. São todos pilares de uma ordem constitucional voltada ao desenvolvimento, à justiça social e à soberania.
A toda evidência, não há como se reconhecer o atendimento ao requisito da soberania nacional quando o próprio país não tem condições de prover a segurança alimentar básica à sua sociedade.
É hora de constitucionalizar o Plano Safra como despesa obrigatória!
A proposta, ora advogada, é simples e poderosa: instituir, via Emenda Constitucional, um percentual mínimo da receita corrente líquida da União — ou do PIB nacional — destinado à política de fomento agropecuário, especialmente ao crédito rural subsidiado, à política de garantia de preços mínimos e ao seguro agrícola. Esse percentual poderia ser revisto periodicamente, via lei complementar, mas os recursos orçamentários mínimos estariam assegurados, independente da política de governo, dado que segurança alimentar é política de Estado.
Esse novo regime jurídico-orçamentário faria do Plano Safra um instrumento de Estado — e não apenas de governo. A previsibilidade resultante traria mais segurança jurídica ao setor, atrairia investimentos, ampliaria a competitividade e reafirmaria o papel do Brasil como celeiro do mundo.
O campo não pode mais ser tratado como linha residual do orçamento. É chegada a hora de o Congresso Nacional, movido pela Frente Parlamentar da Agropecuária, reconhecer que o alimento na mesa começa com o crédito no solo. Saúde e educação já possuem assento cativo no orçamento da República. Está na hora de a segurança alimentar — por meio do Plano Safra — ocupar a mesma dignidade orçamentária constitucional.
André Campello / Advogado Especialista Direito Agronegócio.